terça-feira, 24 de setembro de 2013

CLAMOR POPULAR



A expressão clamor popular pode ser definida como o descontentamento, a indignação ou a comoção popular no meio social, em decorrência da prática de crimes em circunstâncias peculiares, causadoras dessa repercussão. Se observarmos que os códigos de leis foram criados com a única finalidade de organizar as sociedades, podemos afirmar que as leis foram feitas para servi-las. Por isso, me soou estranho o posicionamento do ministro do STF, Luís Roberto Barroso, ao afirmar, durante o julgamento do mensalão, que não está ali para ouvir o clamor popular e sim para unicamente servir à lei. Ora, o Direito não pode ser apenas uma coisa abstrata e técnica, pois trata de defender pessoas e seus interesses. Não podemos ignorar que, invariavelmente, as decisões dos tribunais alteram substancialmente a vida das pessoas e até de um país. Deste modo, percebemos que há alguns ministros da mais alta corte judiciária que subvertem a ordem natural das coisas, preferindo servir à lei ao invés de servir à sociedade. É óbvio que não estou aqui defendendo que os ministros tenham um posicionamento que não esteja perfeitamente embasado na lei. Simplesmente estou dizendo que, numa situação como esta, em que, claramente, as duas posições têm respaldo legal, se estivessem servindo à sociedade - como se esperaria - teriam escolhido a opção da ética. E, com certeza, não estariam caminhando fora da lei, assim como não estavam os cinco magistrados que votaram contra os embargos. Pertinente ainda observar que o clamor popular é um dos instrumentos da lei e os juízes o utilizam como lhes convém. Não são poucos os casos em que os magistrados utilizam este argumento para, por exemplo, negar o pedido de liberdade provisória impetrado pela defesa. Desta vez, vimos exatamente o contrário, quando mais de um magistrado utilizou este argumento para justificar o voto unicamente técnico, isento do clamor popular. Há de se considerar também que, neste caso, independente do fato de alguns rotularem a expressão “clamor popular” como um jargão ou um clichê a ser banido, é patente que a sociedade clama tão somente por ética e nada mais do que isso. Ou seja, há muito mais a observar aí do que simplesmente a denominação a ser dada. O que é de fato inegável é que existe na sociedade, um sentimento crescente de repulsa à falta de ética em todos os níveis, inclusive - e principalmente - no nível da mais alta corte do judiciário, justamente de onde menos se esperava. Além do mais, se o clamor popular, além do argumento ético, também tiver embasamento legal, porque não ouvi-lo e atendê-lo? Interessante também é o fato de que justamente os dois magistrados recém empossados no STF, Luís Roberto Barroso e Teori Zavascki, vieram reforçar o time dos ministros que acham que se deve “pegar mais leve” com os réus dos mensalão e se posicionaram a favor dos embargos e da conseqüente prorrogação do final do processo. Só o fato de serem substituídos dois juízes no decorrer do julgamento, já soa estranho, ainda mais, diante de um processo tão polêmico – e demorado - onde a votação é tão equilibrada. Afinal, quantos magistrados mais ainda poderão ser substituídos até o fim deste julgamento? Cada vez mais, as vozes pela punição imediata e severa aos condenados do mensalão, ficam mais solitárias. Paralelamente - apesar de parecer estranho e absurdo – também percebo, nas recentes afirmações de alguns eruditos de plantão, uma tendência a relativizar os crimes cometidos pelos condenados, a partir da decisão do STF de aceitar os embargos infringentes e reiniciar o exaustivo rito do julgamento, depois de oito anos, prorrogando-o indefinidamente por mais alguns. Então, diante de um prazo destes, afirmar que a sociedade tem pressa em ver os condenados cumprirem suas penas parece um tanto quanto desnecessário. Não obstante, diante de tudo isso, me parece clara a existência de uma estratégia maior, que tem como objetivo eternizar o julgamento, fazendo com que crimes e condenados caiam no esquecimento, o que, convenhamos, é fato comum no Brasil. Então, se os “filósofos do direito” não gostam da expressão “clamor popular”, que tratem de arranjar outra que a substitua, pois o sentimento de frustração e indignação da sociedade é legítimo e cada vez mais gritante e difícil de abafar. Mais uma vez, nos defrontamos com uma situação que vem se repetindo com cada vez mais freqüência: talvez por ainda sofrer os efeitos colaterais da ditadura, na ânsia de garantir plenos direitos individuais de defesa, muitas vezes subvertemos a ética e os valores morais que deveriam ser o norte de toda a sociedade e somos excessivamente permissivos em situações que exigem um mínimo de austeridade, contribuindo para uma impunidade cada vez mais latente, aumentando o descrédito nas principais instituições. Sempre é triste perder a fé, mas, no caso da última instância do judiciário de um país, é muito mais do que triste - é perigoso.

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